domingo, 13 de setembro de 2009

Indios Guarani e Kaiowá são despejados de sua terra em MS, Brasil.


O tempo está fechado. Do céu, ameaça cair água. Água que tanta falta faz nas panelas dos Guarani e Kaiowá que foram despejadas ontem, 11 de setembro de 2009 da área indígena Ñanderu Laranjeiras de Rio Brilhante, MS.
Por ordem da justiça, os indígenas tiveram que se retirar até as 12h e 40 minutos deste dia. Mais uma vez foram expulsos de sua terra. Lá tinham casas, mata, rios, histórias. Em meio ao desespero das crianças, de idosos, de todos, uma liderança se levanta e afirma: ?O nosso sangue também é vermelho. ? Será? Será leitor que o sangue dos indígenas é tão vermelho quanto o dos não indígenas?
Porque se for, o que justifica tanta falta de respeito para com os outros? Pois sim, o problema não é o da cor do sangue, trata-se de um problema social e que não é recente.
Tudo começou com a questionável teoria de que Cabral, junto com os demais portugueses, descobriram o Brasil. Por acaso, eles estavam a correr para as Índias em busca de especiarias, quando no meio do caminho tinha uma pepita. Valiosa, mui valiosa amigos. Desde então, o escrivão Pero Vaz de Caminha, já documentara a existência dos povos indígenas.
Mas até hoje, muitos insistem na inexistência deles. Ou na crença de que eles não eram daqui.
Os portugueses, salvo muitos da atualidade, invadiram o Brasil. Impuseram sua língua, sua religião, seus costumes, seus hábitos alimentares. E muitas de suas limitações para entender a lógica cultural dos outros.
E há mais de 500 anos, os povos indígenas vem sendo execrados pela sociedade por lutarem para que sua cultura permaneça. Lutando pela garantia de sua identidade étnica; que o capitalismo persiste em massificar.
Por acaso, o ?dono?, (digo assim porque não consigo compreender, conceber a terra enquanto propriedade privada) da fazenda onde os índios Guarani e Kaiowá da Ñanderu Laranjeiras foram despejados é conhecido como Português. Sei que há muitos portugueses que não merecem essas palavras, mas não importa, não é a eles a quem me refiro.
O Português conseguiu, por enquanto, que os índios fossem expulsos de suas terras. Os índios, sem ter para onde ir, foram para o lado de lá da porteira, onde a extinta floresta, é cortada por uma rodovia veloz. Montaram barracas de lona, simples e barata doada por alguém, que com certeza não resistiria à água que prometia os céus. Nem ao sol escaldante que precedia tal chuva.
Foi embaixo desse sol escaldante, em que se prostravam crianças, idosos, homens e mulheres em posição de desespero e luta; juntos, unidos, que receberam a presença esperada da Polícia Federal. Em várias viaturas, vestidos de preto, os homens com armas, as mulheres com spray de pimenta, chegaram para o ?diálogo?. As crianças Guarani e Kaiowá olhavam curiosas e intrigadas sem entender o motivo da presença dos policiais ali. Já os policiais, olhavam intrigados a se perguntar do porquê os índios davam as mãos, as mulheres batiam a taquara no chão, em roda, homens, mulheres, crianças, sorrindo, cantando. Rezando.
O Português chegou. Os índios em coro pediam para que ele saísse. Ele não podia compartilhar tanta tristeza. Ele era o culpado.
Quando as viaturas se foram, deixaram aos índios um prazo de cinco dias para retirarem as estruturas de suas casas e a permissão para que eles permanecessem em frente a fazenda. No limite da porteira até a beira da rodovia. Isso, para que pudessem recomeçar já que são de lugar nenhum e lá estão, em vigília constante. De mãos dadas puxaram um guaxiré, esperançosos por justiça, desamparados, abandonados. Mas não terão medo. E Não desistirão. Porque são o povo Guarani, o grande povo.
A chuva chega no sol poente. Os Guarani e Kaiowá ficaram lá. Mais uma vez, a esperar. Maldito seja o latifúndio. Malditas sejam todas as cercas da propriedade privada. Demarcações Já!


fonte: CMI
Carta de solidariedade dos movimentos sociais por ocasião do despejo ao povo Guarani Kaiowá.



11/09/2009 - 12:24 - Carta de repúdio à desocupação da Terra Indígena Laranjeira Ñanderu

Nós

Nós, abaixo-assinados, manifestamos o nosso veemente repudio à atitude de despejo que está sendo realizada na Terra Indígena Laranjeira Ñanderu, no município de Rio Brilhante no estado do Mato Grosso do Sul.



Consideramos que as políticas públicas ineficientes para as comunidades indígenas neste Estado estão levando a essa atitude inadequada e desumana. São muitas famílias que estão vendo seu Tekoha ser ameaçado, porque não há um respeito ao seu direito tradicional.



É profundamente lamentável e desumano que o grupo indígena que esteve há séculos naquela terra, da qual foi violentamente expulso, seja agora mais uma vez jogado para fora. Essa terra é indispensável para os indígenas continuarem a viver conforme lhes garante a Constituição.



Os agentes contrários aos direitos indígenas e responsáveis diretos por mais essa violência terão que dar conta aos cidadãos deste país e do mundo por mais essa agressão às comunidades originárias dessas terras, sendo hoje submetidas a uma das situações de maior violência de que se tem conhecimento.



Enquanto está em curso, embora tardiamente, o processo de identificação dos territórios tradicionais dos Kaiowá Guarani, acontece esse despejo, indicando uma contradição entre o discurso e a ação no sentido de resolver a questão da terra. Mas o que se vê são os sofrimentos sendo propiciados a grupos que estão sendo expulsos.



Estamos solidários à comunidade de Laranjeira Ñanderu e queremos denunciar mais esse absurdo despejo, o qual faz parte da estratégia de concentração de terra e capital nas mãos de uns poucos donos do capital nacional e internacional..



Só haverá, efetivamente, condições de justiça e democracia quando forem reconhecidos os direitos e demarcadas as terras indígenas, nesse caso, em especial no Mato Grosso do Sul.



Diante dessa situação não podemos nos calar, pois ela se torna, a cada dia, uma calamidade publica. Como cidadãos e cidadãs temos a obrigação de defender os povos, que desde a sua colonização foram massacrados. Elegemos representantes para legislar e queremos cobrar deles o compromisso do que ficou garantido na Constituição Federal.



Não haverá tempo para a espera, o poder público deve resolver esse impasse urgentemente, precisamos pagar essa dívida logo e poupar esse povo de sofrimentos vindouros. Por isso exigimos que se devolva aos povos indígenas o que lhes é de direito, não os deixem às margens da vida. Até quando teremos que conviver com injustiças desse porte? Respondam-nos se puderem senhores dirigentes!



O povo lamenta essa situação, e só cabe a vocês, dirigentes dessa nação, a responsabilidade de dar a oportunidade de continuidade dos Kaiowá Guarani. Não há mais tempo...



PARTICIPANTES DO III SEMINÁRIO POVOS INDIGENAS E SUSTENTABILIDADE: Saberes Locais, Educação e Autonomia



Assinam: professores indígenas, professores não indígenas, pesquisadores, gestores educacionais, acadêmicos indígenas e não indígenas.



Campo Grande, MS ,10 de setembro de 2009

fonte: Cimi MS

Nenhum comentário: